Há
segundos que mudam vidas.
O
suor escorria-lhe em bica; Luísa tremia até ao seu mais pequeno átomo de
carbono; nem a alma lhe era poupada. A midríase, a respiração entrecortada e a
taquicardia eram pouco, quando comparadas à ebulição em que se encontravam os
seus neurónios (razão) e músculo cardíaco (coração), ligados por uma rede de
aço invisível. Aquela decisão exigia muito mais do que só coragem: Luísa estava
prestes a quebrar princípios… Desapegada e destemida era ela, mas a questão que
se punha, naquela altura, era a necessidade de uma mentira. Deliberadamente
mentir, para não ser eliminada naquela que seria a última e derradeira etapa da
selecção. Acrescia-se um factor, que a empurrava para a decisão: sabia que se o
fizesse não seria apanhada. As repercussões daquele acto, porém, a acontecerem,
poriam em causa uma missão de escala mundial, de biliões de dólares e a
esperança de toda uma humanidade na conquista de outros mundos, na expansão do
Mundo-Terra ao Mundo-Universo.
Luísa, 35
anos, cientista portuguesa formada na NASA, encontrava-se a um click de enviar
o formulário que, na semana seguinte, a iria por (ou não) no planeta Júpiter.
Quase uma dezena de anos de preparação, de exigentes treinos físicos, de
simulações, de antigravidade, de castração química para evitar que menstruasse,
estavam prestes a dar frutos: a viagem interplanetária! A velocidade da luz
deixaria de ser só utopia. Desde há vários anos que a astronauta deitava-se e
acordava a pensar naquele dia. Não tinha namorados; as hormonas que era
obrigada a tomar, roubavam-lhe a libido e ela também nunca tinha bem definido a
sua sexualidade. Nunca fora uma prioridade. Vivia no Laboratório; dormia em
casa; ouvia jazz. Nas horas livres tinha construído um algoritmo que, no seu
PC, mostrava a contagem decrescente, ao milésimo de segundo, e sinalizava todas
as provas já superadas. Estava no TOP 10 dos mais de cinco mil concorrentes de
todos os cantos do mundo que pretendiam destronar Armstrong na Lua.
Começava,
como todos os questionários anteriores, por um “Juro por minha honra ser
verdade que …”; a estas palavras, que vinham em maiúsculas e a negrito,
seguiam-se uma série de itens para seleccionar “Sim” ou “Não” e que eram
eliminatórios.
A última cruz
tinha sido colocada. Os dedos trémulos pousados sobre
o teclado, o cursor a viajar sobre o botão ENVIAR...
Há segundos que mudam vidas. Mas
tudo perece.
Sem comentários:
Enviar um comentário
O que se diz por aí...